Holofotes - Terceiro Episódio

 


                              

 

Série criada e escrita por:

Thiago Figueroa 

 

 

 

Personagens deste episódio

 

RITA .................................................................ROSAMARIA MURTINHO

STELLA............................................................ARACY BALABANIAN

LEILA.......................................................................BIA SEIDL

ALBERTO........................................................CÁSSIO GABUS MENDES

VÂNIA......................................................................MARIANA XIMENES

CARLOS................................................................ARY FONTOURA

MARGO……………………………………………..........BIA NUNNES

ANTÔNIA.................................................................VITÓRIA STRADA

HEITOR....................................................................REGINALDO FARIA

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Cena 1. TV Astro. Estúdio. Int. manhã

Vista aérea dos estúdios com o cenário que recria a parte interna de uma mansão. Depois a câmera foca na equipe ajeitando a luz e levando as peças do cenário de um lugar para o outro. Rita aparece sentada dentro da mansão cenográfica caracterizada para a sua personagem com um vestido preto enquanto lê o roteiro com os seus óculos, até que vira os seus olhos para dois homens colocando uma geladeira em um canto dos estúdios. Um cenógrafo passa pela atriz.

Cenógrafo – A geladeira que a Stella pediu finalmente chegou. Essa transportadora é péssima!

Foco em Rita observando a geladeira sendo instalada.

Corta para:

Cena 2. Camarim de Stella. Interior. manhã

Stella se encontra sentada em frente ao espelho portando um casaco de pele branco, enquanto sua assistente aparece com uma caixinha preta.

Assistente – (Abrindo a caixinha que revela um colar de pérolas) Como a senhora pediu!

Stella – Eu nunca pensei que um dia fosse precisar trazer acessórios de casa. Antes isso que ter alergia com bijuteria.

Stella põe o colar em seu pescoço.

Stella – Obrigada, Ellen! Já pode sair! Daqui a pouco o meu maquiador chega e não vai caber mais de três pessoas aqui.

Assistente – Como a senhora quiser!

A assistente se retira e logo em seguida surge Rita.

Rita – (Aparecendo pelo reflexo no espelho enquanto Stella se ajeita) Eu pensei que ninguém se lembrasse mais dos comercias de geladeira da Homeshop.

Stella – Podem ter sido as geladeiras mais defeituosas dos anos 60, mas ao menos você foi a melhor garota propaganda deles.

Rita – Olha... Não precisamos virar amigas, mas essa série é tão importante para mim quanto é para você. Eu serei profissional exatamente como eu sempre fui e só peço que você faça o mesmo.

Stella – Nem precisa se preocupar, assim como eu sei que não preciso me preocupar com o seu compromisso, você dará o seu melhor como sempre fez.

Rita – Obrigada, bem eu...

Stella – (Interrompendo) Ah, vamos! Não precisa ser modesta, você reconhece as suas qualidades e eu sei bem que dispensa esse tipo de comentário vindo de mim. Mas não estou elogiando, só sendo justa.

Rita – De qualquer forma, faça por você. Acho até que se sair bem.

Rita se vira e vai andando.

Rita – Ah! Tira um pouco desses joias, sua personagem não é tão excêntrica.

Close no rosto de Stella. Pequeno corte para um foco em um pote de creme, que Stella pega e começa a passar no rosto. A atriz para e começa a olhar fixamente para o seu reflexo por alguns segundos, para depois continuar passando o creme. Vânia entra.

Vânia – Olá, senhorita Mancini! Eu sou Vânia, sua maquiadora!

Stella – Vânia? Eu pensei que seria o Rogério, faz tempo que não o vejo...

Vânia – Ele se estressou depois de trabalhar com um atriz jovem que reclamava por ficar horas sentada sendo maquiada e preferiu se aposentar.

Stella – Bom... Que seja.

Corta para:

Cena 3. Quarto Cenográfico. Int. manhã

Rosto de Stella em uma câmera, é revelado que a equipe gravando uma cena da atriz no cenário. Sérgio está em sua cadeira ao lado do cameraman do lado de fora do cenário. Stella está sentada na cama falando ao telefone.

Stella/Eveline – É por isso que vocês não souberam se adaptar ao fim do cinema mudo! Acham mesmo que dá para manter um estúdio com rostos frívolos e vazios (Desliga o telefone).

Sérgio – (Gritando) Corta! Muito bem, mas acho que você na cama não precisa demorar tanto para pegar no telefone. Vamos de novo!

 Assistente - Cena 2, plano 4, tomada 2 (Bate a claquete).

corta para:

CENA 4. Camarim de Rita. int. manhã

Rita, em pé, ajeita o seu chapéu preto enquanto se olha no espelho.

Rita – Acho que ela precisa ser meio excêntrica.

Maquiadora – A Stella usava um chapéu parecido no jantar para acertar sua entrada na emissora. Já faz muito tempo, mas eu lembro já que eu cuidava dela! Ela adorava usar chapéus.

Rita ouve enquanto olha para os figurinos no guarda-roupa.

Maquiadora – Para você lembrar mais só precisava de um desses lencinhos que ela colocava no pescoço.

Foco em Rita pensativa.

corta para:

Cena 5. Quarto Cenográfico. Int. manhã

Stella sai do seu personagem e fica no cenário lendo o roteiro enquanto fala com o diretor.

Stella – Eu sinceramente acho que essa cena deveria ser maior. Ela até perde o impacto sendo tão curta.

Stella sai do cenário e anda pelo estúdio. Após um pequeno corte, vemos a lente da camêra, até que é revelado o diretor assistindo a gravação de cena de Rita ao lado do cameraman e do resto da equipe.

Sérgio – Corta!

Stella se aproxima.

Sérgio – Perfeito!

Um iluminador aponta o holofote para Rita no cenário, mostrando a atriz trajando, além de um vestido preto e um chapéu da mesma cor, um lencinho branco no pescoço. Stella fica em estado de choque.

Stella – Por que está tão elegante? Que eu saiba sua personagem é uma mera assistente. De onde veio esse requinte todo?

 Rita – Se você tivesse lido o roteiro todo, saberia que ela é uma mulher de classe. Atores de verdade leem o roteiro inteiro, não só as suas partes. Eu mesma me dispus a emprestar algumas peças ao figurino.

Rita se afasta.

Sérgio – Ok, vamos continuar.

corta para:

CENA 6. Restaurante. Interior. Noite

Sonoplastia: Até o fim desta cena



Restaurante chique um piano no fundo. Leila se senta na mesma onde estão Rita e Stella.

Leila – (Se sentando) Fico feliz que tenham aceito o meu convite. Esse é o meu restaurante favorito da cidade! Soube que aqui a Brigitte Bardot deu 100 dólares de gorgeta para cada drink.

Rita – Porque eu sei que você é uma crítica com credibilidade. Essa é com certeza uma qualidade em falta na nossa roda.

Stella – Mas e então, você não iria só fazer uma nota sobre a série quando estivesse no ar?

Leila – Eu vou primeiro lançar uma nota com detalhes sobre a trama. Pelo menos essa semana não vou escrever só sobre mais um filme de terror medíocre... Vamos pedir nossas bebidas?

Rita – Dry Martini, sempre!

Leila – Aqui eles agora tem com cebolinha, que nem a Bette Davis tomava em A Malvada.

Pequeno corte.

Leila – Não se acanhem! Isso é uma conversa entre amigas! E então? Sobre o que é a trama?

Stella – É sobre uma escritora frustrada que se aproxima de uma atriz em decadência para se enturmar com os amigos autores e acaba fazendo sucesso escrevendo uma história sobra a vida conturbada da patroa. Tenho certeza que Rita fará dessa protagonista um dos maiores papéis da sua carreira!

Rita – As duas personagens são importantes!

Stella – Mas todos nós sabemos que a sua tem mais foco! Eu faço apenas uma atriz que vive na ilusão de que ainda está nos seus tempos áureos.

Leila – Tipo uma Norma Desmond!?

Stella – Isso, isso... Sabe, Leila, eu realmente tinha esse desejo de trabalhar com a Rita desde que fazia parte da TV Astro. (A câmera vai mostrando a Rita bebendo dry martini enquanto Stella fala) Foi uma pena eu ter tido que sair da emissora depois de escalarem a mim e a Rita para o mesmo personagem lá em 63, mas fico feliz que agora estamos todos bem e faremos essa parceria.

Uma garçom aparece e coloca na mesa os pratos cobertos por tampas de metal. Em seguida o garçom tira a tampa do prato de Leila, revelando costeletas de cordeiro com um molho de vinho avermelhado.

Leila – Perfeito!

corta para:

Cena 6. Mansão cenográfica. Int. manhã

Foco em uma câmera, a cena revela Rita gravando uma cena dentro de uma sala cenográfica enquanto o diretor Sérgio e sua equipe gravam do lado de fora.

Sérgio Corta!

Rita sai da sua personagem mas continua dentro do cenário.

Sérgio – Agora vamos gravar a cena da vizinha!

Rita – Por falar nisso... Ela está por aqui?

Antônia aparece caracterizada com rabo de cavalo e um vestidinho rosa.

Antônia – Me desculpem o atraso, eu saí ontem de noite e acabei perdendo o horário.

Rita olha Antônia de cima a baixo.

Rita – No roteiro ela parecia ter mais de quarenta anos.

Sérgio – A produção precisava de sangue novo! E o teste dela foi perfeito!

Antônia – E então? Onde eu tenho que ficar mesmo?

corta para:

Cena 7. Sala de Carlos. Interior. Tarde

Sonoplastia: Até o fim desta cena



Carlos está de pé com um copo de whisky na mão enquanto Alberto está sentado na cadeira.

Carlos – Boa notícia: Eu já consegui os patrocinadores necessários! Inclusive vamos conseguir fazer uma festa de lançamento antes de todos os episódios serem gravados!

Alberto – Viu só! Eu disse ia dar certo!

Carlos – Pode até ser, mas o que o público esperava mesmo era o confronto entre duas lendas! Não vamos conseguir nada com as duas fingindo amizade perto da imprensa!

Alberto – Você queria mesmo que a harmonia nas gravações estivesse em risco?

Carlos – Temos que pensar no bem no bem maior! Ou acha que isso não vai virar um caos quando essas duas vivarem amigas de verdade e se unirem para me encher de exigências! Uma só já me envelheceu dez anos! Imagina as duas juntas!

Alberto – Eu não sei se esse é o melhor caminho!

Carlos – Acho que já passou da fase de olhar para o ramo com olhos da ficção! Eu já tenho muitos anos comandando essa emissora! Um trem consegue andar descartando um vagão e até colocando outro no lugar, mas não vai para lugar nenhum sem o maquinista!

Alberto – Só não me culpe depois...

Carlos – Você já a menina que faz a vizinha? Acho que ela tem futuro!

Alberto – Mas foi só uma participação especial!

Carlos – Acho que dá para você deixar a vizinha fixa, tenho certeza que todos vão adorar.

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Cena 8. Restaurante. Interior. Noite

Sonoplastia: Até o fim desta cena



Alberto e Leila conversam em uma mesa.

 

Leila – Eu lamento, mas o estúdio recusou o roteiro do seu filme!

Alberto -  É isso que eu ganhou depois de tudo que eu escrevi para eles!

Leila – Não está sendo uma experiência incrível escrever para a TV? Achei que seria um sonho ser o responsável por juntar duas grandes atrizes. 

Alberto – Você deve imaginar como deve ser insuportável ser podado enquanto fazem questão de te humilhar. Ainda bem que eu não tenho mais nenhuma ilusão com esse meio. 

Leila – Você me lembra um pouco o Cláudio. Ele gosta tanto de ter o controle de tudo que decidiu que funciona melhor escrevendo o que vai dirigir. 

Leila pega um roteiro e mostra para Alberto. 

Leila - Dá uma olhada nisso!

Alberto - (Lendo) É um filme de terror?

Leila - Aparentemente ele decidiu ter mais uma semelhança com o Hitchcock, porque ter uma esposa que corrige os seus roteiros não era suficiente. 

Alberto - (Lendo) Terror sobre uma socialite viúva... Tereza Rachel vai adorar perder a voz nisso aqui!

corta para:

Cena 9. Mansão de Rita. Interior. Noite

Na sala de estar, Rita está segurando duas taças de dry martini e entrega uma a Heitor.

Heitor – E então, como estão as filmagens?

Rita – Que nem a guerra fria! É como se eu e Stella fossemos os Estados Unidos e a União Soviética pressentindo um ataque a qualquer movimento. Quando essa série acabar, espero que ela vá para bem longe! Pode ir para Las Vegas tentar vender o chimpanzé empalhado que comprou no leilão de um estúdio falido em Los Angeles!

Heitor – Eu que estou ansioso para irmos para Las Vegas! Tenho certeza que a Rota 66 é bem mais interessante de percorrer que uma estrada esburacada qualquer. 

Rita – (Bebe um gole de martini) Sei onde quer chegar...      

 Heitor – Você acha que isso tudo compensa o adiamento do seu american way of life?

Rita – Eu já disse que quando o seu clube de jazz realmente sair do papel, eu me mudo de vez para Nova York, mas não quer dizer que eu não vá qualquer oportunidade que surgir. 

Heitor – Ou oportunidade que você praticamente tenha que criar. 

Rita – Joan Crawford que fez Baby Jane acontecer! Não é nada inédito uma atriz dar o pontapé inicial de um projeto. Dá mesma forma que você decidiu montar uma casa de jazz em Manhattan. 

Heitor – Acho que vai ser um bom hobbie. 

Rita - Hum... Que bom que você está animado com o seu novo hobbie. Como está se saindo até agora?

Heitor – Eu consegui comprar um antigo clube. O jantar de hoje era para comemorar. 

Rita - Você sabe que eu teria ido se fosse possível. 

Heitor – Tinha um pianista tocando suas músicas favoritas do Bill Evans... Você saberia se tivesse ido. 

Rita - Sabe de uma coisa... Eu cansei desse enredo. Procure algum filme na minha coleção, tenho certeza que encontrará algo menos cansativo. 

Heitor – Eu vou para um piano bar encerrar a minha noite. 

Rita – (Meio irônica) É algum novo?

Heitor - Também saberia se tivesse ido. 

corta para:

Cena 10. Casa de Alberto/Mansão de Rita. Interior. Noite


Em sua cama, Alberto fala ao telefone com Rita, que está de pé em sua sala segurando uma taça de dry martini. 

Alberto - Oi, Rita! Me desculpe ligar assim tão tarde... então... O que você achar de tirarmos um tempo amanhã para conversarmos sobre a série. 

Rita - Conversar sobre a série... Você está livre agora?

corta para:

Cena 11. Mansão de Rita. Interior. Noite

Sonoplastia: Até o fim desta cena



Rita anda pela sala com dois copos de whisky e vai até Alberto.

Rita - Pelo que vi você confia mesmo na Stella. Quando eu te mostrei a história da Doris Duke, não imaginei que você usaria assim. Eu vi que a inspiração foi além de ajudar músicos de jazz. 

Rita entrega um dos copos para Alberto e se senta em outro sofá.

Alberto - Ultimamente eu estava com vontade de escrever sobre a infelicidade que pode estar por trás de uma vida aparentemente perfeita. Eu vi várias possibilidades em um artigo do New York Times: casamentos fracassados, filhos que odeiam os pais, ou pais frustrados que tentam realizar seus sonhos através dos filhos... Eu queria aproveitar para fazer algo assim agora, porque vai saber quando eu teria outra chance. Mas eu queria mesmo que esse nosso projeto um dia existisse mesmo.

Rita - Não seja pessimista, você ainda vai tirar essa história do papel com alguma atriz em melhor fase. 

Alberto - Posso te fazer uma pergunta? 

Rita - Se não for sobre como eu torci o pé em um número de ''Hello, Dolly!"...

Alberto - Eu me lembro de uma atriz tão imponente e confiante... O que aconteceu com ela?  

Rita olha de forma séria para Alberto.

Rita – Ela cresceu! E não quiseram cresceu junto com ela. (Bebe um gole) Eu via muitos filmes sobre mulheres de sucesso que tiveram que sacrificar a vida pessoal. Quando eu fui de protagonista para mãe de protagonista eu comecei a pensar no que você abdica e no que sobra quando tudo que você construiu em toda sua vida começa a desmoronar bem na sua frente. 

Alberto - Um legado, claro.

Rita - Além de uma carreira que se resume em passado tem o quê? Três casamentos fracassados? Acho que quatro. Se eu tivesse filhos, provevelmente completaria o bingo do New York Times.  

Alberto – Se uma uma atriz consagrada acha que não tem nada para se orgulhar, imagina um autor fracassado que não tem nada para evaporar porque não conseguiu construir nada além de uma vida engolindo sapo.

Rita - Não precisa se menosprezar, tenho certeza que todos os pais sonham em ler o nome do filho na televisão. 

Alberto - Meus pais sonhavam com um filho médico... Pelos menos podem se orgulhar do meu irmão formado em Oxford. 

Rita – Viu só! No final todos sairam ganhando. Ele eu imagino que está feliz sendo médico e você um ótimo autor. Se eles soubessem como é o Menezes, admirariam você não ter jogado aquela máquina de escrever cafona na cabeça dele.

Alberto ri.

Alberto – Mais whisky?

Rita – (Balançando o copo) Por favor!

Alberto se levanta. Sozinha no sofá, Rita fica pensativa enquanto segura o copo vazio. Corta para a fachada da mansão, enquanto a câmera vai se afastando.

 

FIM DO TERCEIRO EPISÓDIO.                                                                  

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