Nos Trilhos: Capitulo 21 (ÚLTIMAS SEMANAS!)


Novela de

Sandy

 

Escrita por

Sandy


 Classificação: 



Personagens deste capítulo:

ANA e antítese de Ana (Carolina Kasting)

CARLO (Danton Mello)

GISELE (Christine Fernandes)

LÍVIA (Lucy Ramos)

BEATRIZ (Nívea Maria)

CARLA (Débora Falabella)

LIZA (Vivianne Pasmanter)

NANDO (Chay Suede)

PAULO (Murilo Benício)

PEDRO (Dan stulbach)

LEILA (Giovanna Rispoli)

HELOISA (Ângela Vieira)

LÚCIO (Dalton Vigh)

LOLA (Maria Clara Gueiros)

HEITOR (Marcelo Médici)

HENRIQUE (Petrônio Gotinjo)

MAXIMILIANO (Emílio Orciollo Netto)

VIRGÍLIO (Marcelo Melo jr.)

VIRGINIA (Lavínia Vlasak)

CAROLINA (Isabel Fillardis)

LEANDRO (Fernando Pavão)

BELLA (Barbara França)

EMÍLIO (Danilo Mesquita)

 

Título do capítulo de hoje: "Abandono"




CENA 01 CONTINUAÇÃO DIRETA DA ÚLTIMA CENA DO CAPÍTULO ANTERIOR PRÉDIO DE ANA EXT/NOITE


 


Leonora dá um tchauzinho de miss, o taxista arranca. Ana permanece ali sozinha durante um tempo, olhando as estrelas no seu escuro; de repente alguém se aproxima atrás dela e toca-lhe no ombro esquerdo.

 

ANA: Quer me matar de susto!

 

A expressão dela muda, de raiva à um espanto trêmulo, ao ver Carlo à sua frente: com um moletom surrado e barba por fazer.

 

CARLO: Nós precisamos conversar, um assunto muito sério.

 

Passado o susto, Ana olha para Carlo: a barba por fazer lhe chama atenção.

 

ANA: Vamos subir? Eu passo um café pra gente...

 

CARLO: Eu não quero incomodar... Seu marido está?

 

ANA: (Constrangida) Está e ele costuma dormir tarde...

 

CARLO: Precisamos conversar à sós.

 

Eles permanecem em silêncios durante um certo tempo, olhando um para o outro.

 

ANA: Vamos andar um pouco, preciso mesmo tomar um ar.

 

Carlo assente com a cabeça e os dois somem na escuridão, CORTA PARA:

 

CENA 02 PRAIA DESERTA EXT/NOITE



 

Carlo e Ana sentam na areia da praia em silêncio, escutando o som das ondas indo e vindo.

 

ANA: O gato comeu a tua língua?

 

CARLO: Tô procurando as palavras certas, não quero te assustar.

 

ANA: Aconteceu alguma coisa contigo?

 

CARLO: Comigo não, eu tô legal...

 

ANA: Eu soube que você vai rodar um filme, tá podendo hein!

 

CARLO: Eu sempre quis contar uma história, uma história que está no meu sangue... Que de alguma forma, está na minha voz, nos meus gestos... A história dos meus ancestrais, lá da Itália...

 

ANA: E quando acabar o filme, vai contar novas histórias?

 

CARLO: Não sei, talvez a fonte seque, e eu volte a ser um cara comum, um humilde programador de computadores...

 

ANA: Quanta modéstia! Um programador que rodou o mundo, programando e fotografando tudo e todos!

 

Ana sorri, Carlo desconversa.

 

CARLO: Nada do eu possa fazer, nenhuma história que eu conte, fará sentido sem eles...

 

Ana faz uma careta de estranhamento.

 

ANA: Espero que não tenha a ver com o Nando, aquele velho não...?

 

CARLO: Fique tranquila, o velho reagiu relativamente bem a tudo isso; demorou, mas ele e o neto conseguiram superar... Pelo menos antes de...

 

ANA: Desembucha logo, esse mistério todo está me dando nos nervos!

 

CARLO: Hoje de manhã, quando eu cheguei na casa deles, estava tudo quieto... Quieto até demais... Não tinha ninguém em casa, liguei pro Nando (ele tinha dormido no Emílio), peguei a chave reserva e entrei.

 

ANA: Não me diga que aconteceu algum acidente ou...

 

CARLO: Os velhos sumiram do mapa, não deixaram vestígio! Eu revirei a casa toda! As roupas estão nos guarda-roupas, o dinheiro continua guardado... Até os remédios da pressão estão no banheiro! E não deixaram nenhum bilhete, nada! A única coisa que sumiu com eles, foi um álbum de fotografias...

 

Ana para um tempo, totalmente atônita.

 

ANA: Como você se deu conta do álbum?

 

Carlo retira uma foto do bolso do seu moletom.

 

CARLO: Eu tinha pegado essa aqui emprestada, pretendia devolver, mas...

 

A foto mostra Ana e Carlo adolescentes, abraçados e contentes.

 

ANA: Talvez ela tenha mudado o álbum de lugar...

 

CARLO: Eu revirei aquela casa atrás dele, não está lá, eles o levaram para onde, só Deus sabe!

 

Ana levanta-se, cambaleando.

 

ANA: Precisamos ir na polícia!

 

CARLO: Eu e o Nando já fomos, eles disseram que precisamos esperar 48 horas para registrar um boletim de ocorrência!

 

Ana quase cai, mas é amparada pelos braços de Carlo, CORTA PARA:

 

CENA 02 APARTAMENTO DE ANA INT/NOITE

 

Ana entra no apartamento silenciosamente.

 

PAULO: Demorou.

 

ANA: Sai pra tomar um ar por aí.

 

PAULO: A essa hora e sozinha, não é perigoso?

ANA: Foi tranquilo.

 

Os dois se entreolham, ela beija o marido.

 

ANA: Vou deitar, vai ficar aí?

 

PAULO: Vou terminar aqui um trabalho e já já vou.

 

Ela assente com a cabeça e sai para o quarto: se joga na cama, abraçando com força um travesseiro.

 

FLASHBACK ON:



 

Beatriz e a filha tomam café num dia chuvosa.

 

BEATRIZ: Vai querer mais um pedaço de bolo?

 

ANA: Não, não! Você quer me entupir de bolo de fubá, por que?

 

BEATRIZ: Tô meio agoniada hoje, já comi umas três fatias desse bolo, é melhor alguém me ajudar a acabar com ele...

 

ANA: ... ou vai acabar comendo ele inteiro sozinha!

 

BEATRIZ: Eu me empenhei fazendo, dá trabalho! Não é justo que fique às moscas; às vezes eu tenho a sensação que todo o meu trabalho é em vão, o trabalho de uma vida inteira!

ANA: Como alguém que nada, nada num mar infinito e nunca sai do lugar? Às vezes eu me sinto assim também, mas é a vida mãe: chega uma hora que nos sentimos insuficientes.

 

Beatriz se levanta, nervosa.

 

BEATRIZ: Coisas inúteis deviam sumir, eu queria sumir, desaparecer! Sem deixar vestígios, me desintegrar! Quer mais chocolate quente?

 

Ana assente com a cabeça, nervosamente Beatriz enche a xícara da filha e acaba derramando na mesa.

 

ANA: Viver é algo inútil por si só.

 

FLASHBACK OFF.

 

Ana tampa os ouvidos com a almofada, CORTA PARA:

 

CENA 03 APARTAMENTO DE ANA INT/DIA

 

Ana escova os dentes no banheiro, quando se vira dá de cara com a sua velha amiga.

 

ANA: Pensei que você tivesse sumido para sempre da minha vida, sem avisar: uma benção!

 

ANNA: Onde já se viu alguém viver sem consciência? Não sumi, apenas tirei férias longuíssima!

 

ANA: Deixou de fuxicar a minha vida amorosa?

 

ANNA: Seu casamento é uma chatice: felicidade não rende pano pra manga, por isso torcemos: “tomara que caia!”.

 

ANA: E voltou por que, então?

 

ANNA: Sou a maior #Carlana shipper do planeta, e aí? A perna bambeou no reencontro?

 

Automaticamente o rosto de Ana torna-se rubro.

 

ANA: Numa situação dessas você vem me perguntar uma coisa dessas? Minha mãe, uma senhora indefesa sumiu! A essa hora o corpo dela pode estar gelando num freezer de algum necrotério fétido!

 

ANNA: Tremeu ou não tremeu?

 

A visão cruza os braços.

 

ANA: Consciência sem noção!

 

ANNA: Então tremeu?

 

Ana receia, mas acaba assentindo com a cabeça, CORTA PARA:

 

CENA 04 FACULDADE INT/DIA



 

Ana, tentando se manter controlada, dá uma de suas aulas normalmente.

 

ANA: Anne Eliot de “Persuasão” é a heroína de Jane Austen que mais se aproxima de um comportamento tido como romântico, em oposição a crítica que a autora parece tecer a esse tipo de comportamento mais sanguíneo em livros como “Razão e sensibilidade” e “Orgulho e preconceito”. Anne ama uma vez, ainda que tenha tomado decisões racionais, decisões que a fizeram sofrer, mas que precisavam ser tomadas... Vou ler aqui um trechinho, quando ela reencontra o seu amor do passado pela primeira vez, o capitão Wentworth:

 

Ela olha para seus alunos, suspira profundamente.

 

ANA: (Lendo) Oito anos, quase oito anos haviam se passado desde que tudo

terminara...

 

Enquanto lê, sua visão se embaça, e Ana é teletransportada pela sua imaginação para dentro do livro: vestida com um lindo vestido da era Regenciana inglesa, reencontra Carlo por acaso.

 

ANA: (Lendo) Que absurdo retomar a agitação que esse intervalo havia embaçado e banido para longe! O que oito anos não eram capazes de fazer? Acontecimentos de todo tipo, mudanças, distanciamentos, partidas… tudo, tudo podia ser incluído em tal intervalo, e também o esquecimento do passado… nada mais natural, nada mais certo! Oito anos representavam quase um terço de seu tempo de vida!

 

Carlo faz uma reverência, que ela responde constrangida. Ana volta, da sua imaginação para a sala de aula.

 

ANA: (Lendo) Infelizmente, apesar de todas as ponderações, Anne constatou que, para sentimentos represados, oito anos talvez não fossem quase nada.

 

Ana fecha o livro, com o peito palpitando, alguém pede licença para ir ao banheiro, ela responde quase sem voz, CORTA PARA:

 

CENA 05 PRÉDIO DE ANA INT/DIA

 

Ana chega e cruza com Lívia no corredor, as duas se cumprimentam friamente.

 

ANA: Ainda colhendo louros do intercâmbio?

 

LÍVIA: Acho que sim, foi uma experiência enriquecedora.

 

ANA: Imagino.

 

LÍVIA: Você comentou uma vez que que tinha vontade de fazer um pós-doutorado em Roma...

 

Ana mostra o anel de casamento.

 

ANA: Eu disse sim as oportunidades que a vida me deu, e alguns sonhos acabaram ficando pra trás...

 

LÍVIA: A vida é feita de perdas e encontros, nem sempre podemos carregar na mala, tudo o que queremos manter junto do coração.

 

ANA: Nós erramos muitas vezes, não somos dignos de conservar relações: pessoas não são coisas, se não agimos com lealdade e cumplicidade, é natural que elas se afastem de nós!

 

Ana sai, deixando Lívia transtornada, CORTA PARA:

 

CENA 06 CASA DE BEATRIZ INT/DIA



 

Carlo abre um livro na estante, coincidentemente “Persuasão” de Jane Austen e começa a folheá-lo, e começa a ler exatamente a parte onde o Capitão Wentworth escreve uma carta para Anne.

 

CARLO: (Lendo) Não posso mais escutar em silêncio. Preciso lhe falar com os meios dos quais disponho. A senhorita me dilacera a alma. Estou dividido entre aagonia e a esperança. Não me diga que chego tarde, que aqueles tão preciosos sentimentos desapareceram para sempre. Ofereço-me outra vez à senhorita com um coração ainda mais seu do que quando a senhorita quase o partiu, oito anos e meio atrás.

 

Ele se vê transportado, como Ana, ao universo do romance: ele sofre ao escrever aquela carta, com uma pena branca e tinta azul marinho, sentado numa escrivaninha de ébano com detalhes dourados.

 

CARLO: Não se atreva a dizer que o homem esquece com mais facilidade do que a mulher, que o seu amor morre mais cedo. Nunca amei ninguém além da senhorita. Posso ter sido injusto, fraco e ressentido, eu fui, mas nunca inconstante.

 

De volta ao planeta terra, Carlo afasta o livro e põe as mãos na cabeça, CORTA PARA:

 

CENA 07 LIVRARIA MEGA STORE INT/DIA

 

Gisele passa na livraria despretensiosamente depois de fazer algumas compras.

 

VENDEDORA: Todos estão muito ansiosos pelo próximo livro do seu marido! E sempre que alguém leva o anterior escrito por ele, volta procurando mais coisas do autor!

 

GISELE: Fico muito feliz por ele, mas e o meu, tem saído?

 

A vendedora parece recear dar uma resposta.

 

VENDEDORA: Tem saído pouco, você sabe que a Sognare não tem comprado mais espaço na vitrine... E esse tipo de livro ilustrado é para um público muito especifico...

 

GISELE: (Desapontada, mas não surpresa) Entendo...

 

VENDEDORA: As pessoas ultimamente andam preferindo livros de colorir, sabe? Aquela onda de “faça você mesmo” e “ponha a mão na massa” ...

 

Gisele faz uma careta.

 

GISELE: Ler imagens não é tão simples quanto parece.

 

A vendedora se vira para atender um cliente e Gisele sai, CORTA PARA:

 

CENA 08 APARTAMENTO DE GISELE INT/DIA

 

Lúcio fala com Virgínia por telefone.

 

VIRGÍNIA: (Por telefone) [...] Que bom que você pensou bem e resolveu considerar os meus conselhos!

 

LÚCIO: Você é a minha editora, sabe o que o mercado precisa, vou confiar no seu faro. Não cederei por completo, espero que você faça algumas concessões em seus planos.

 

VIRGÍNIA: Não pense que sou uma ditadora, sempre estive aberta ao diálogo. Relaxe, chegaremos num consenso. 

 

LÚCIO: Minha mulher vai ler, vou pedir também para alguns amigos darem uma olhada também. Quero ter uma visão mais ampla do efeito do meu romance nas pessoas.

 

VIRGÍNIA: Podemos pedir para nossos colegas aqui da editora lerem também.

 

LÚCIO: Estamos quase organizando um clube do livro!

 

Lúcio ri no telefone, Gisele entra.

 

GISELE: (Com ciúmes) Viu passarinho verde, ou melhor, ouviu o seu canto?

 

Lúcio se despede e desliga.

 

LÚCIO: Estava falando com a Virgínia, sobre o meu livro.

 

GISELE: Não sei como você aguenta ficar tanto no telefone com ela, a voz dela me dá nos nervos! É insuportável!

 

LÚCIO: Sou indiferente a voz dela, na verdade, nunca tinha reparado...

 

GISELE: Talvez não seja nem a voz em si, mas o tom meloso, arrastado... Como se quisesse tirar algo de você, sugar as suas entranhas, a sua alma!

 

Lúcio faz uma careta de ceticismo, CORTA PARA:

 

CENA 09 APARTAMENTO DE ANA INT/DIA

 

Flashs rápidos mostram Ana chegando em casa após o trabalho, tomando um banho relaxante e demorado. Ela acaba cruzando com Paulo quando sai do banheiro.

 

PAULO: Tá cansada né? Mas aguenta firme, já já as férias do meio ano começam!

 

ANA: Cansada não é exatamente a palavra...

 

PAULO: (Assustado) O que aconteceu?

 

Ana senta-se na cama e Paulo se aproxima, sentando ao seu lado.

 

ANA: Desde que eu era uma menina, minha mãe grita para os quatro ventos que quer sumir, desaparecer... Se desintegrar, sem deixar vestígios. Isso em meio a brigas com o meu pai, em meio a relação que ela construiu depois que eles se separaram...

 

PAULO: Todo mundo já quis sumir mais de uma vez, é natural querer fugir quando a coisa aperta...

 

ANA: Ela nunca quis fugir, ela lutou com unhas e dentes durante toda a nossa vida... Uma vida sob aquela maldita máquina de costura, uma vida escutando aquele barulho que não me deixava dormir! Nem do meu pai ela fugiu, independente do comportamento violento que ele demostrava contra nós: ela o deixou, o largou sozinho e foi trilhar um novo caminho!

 

PAULO: Não tô entendendo aonde essa conversa quer chegar...

 

ANA: Suicídio? Não, ela queria deixar de existir, sem fazer ninguém sofrer.  Ela queria sumir, desaparecer...

 

Ana cai no choro, o marido a consola.

 

ANA: Ela sumiu, Paulo;

 

Em Paulo abraçando Ana.

 

FIM DO CAPÍTULO.





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