Holofotes - Oitavo Episódio

                                           


 

Série criada e escrita por:

Thiago Figueroa

 

Personagens deste episódio

 

RITA - ROSAMARIA MURTINHO

STELLA - ARACY BALABANIAN

ALBERTO - CÁSSIO GABUS MENDES

LORETA - ISABELA GARCIA

LEILA - BIA SEIDL

LEONORA - GLÓRIA MENEZES

MARGO - BIA NUNNES

CARLOS - ARY FONTOURA

REBECA - FRANÇOISE FORTON

ROBERTO - HERSON CAPRI

Participação Especial

VIRGÍNIA - VIVIANNE PASMANTER

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Cena 1. Restaurante. Interior. Manhã

Sonoplastia: Até o fim desta cena 



Fachada do restaurante. No interior é revelado uma mesa próxima ao pianista onde está Leonora, usando um vestido vinho e um chapéu preto com plumas, conversando com Loreta.

Leonora – Foi a Bette Davis que disse que nos bastidores das premiações há atuações melhores que nas telas. Não que seja um fato inédito que precise ser noticiado em alguma coluna.

Loreta – Então você acha que tudo estaria bem se tivessem indicado a Rita e a Stella na categoria principal?

Leonora –  Todos sabiam que elas jamais seriam amigas. Eu achava que elas logo poderiam apenas sentir indiferença uma da outra, mas aconteceu do reator explodir. O grande estopim foi a Stella ganhar um prêmio com uma personagem que a Rita recusou. Certamente você deve imaginar a pressão que um mero prêmio pode causar. Você pode ser bom, mas precisa sempre lutar para conseguir um lugar no pedestal e depois lutar para perder o seu espaço. 

Loreta – Eu também imagino que comandar um programa de televisão também envolve muita pressão. O que dizem sobre você já ter tido rixa com outras apresentadoras é verdade? 

Leonora – Rixa para existir precisa de um ódio mutuo, uma implicância contínua... E eu nunca tive tempo ou cabeça pra isso, mas histórias sobre competições sempre vendem bem. Enfim... Óbvio que Stella ficou irritada por ser praticamente chutada depois da rivalidade gerar lucro tanto para a emissora quanto para colunistas.  

Corta para:

Cena 2. TV Astro. Interior. Manhã

Sonoplastia: Até o fim desta cena 

Leonora, elegantemente trajada com um sobretudo preto e uma saia branca, anda pelos estúdios com óculos escuros e papéis em mãos. Sua assistente corre até ela e a acompanha.

Leonora – (Andando enquanto olha pra frente) Será que uma atriz que não faz uma novela de sucesso há dez anos tem uma agenda tão cheia ao ponto de não confirmar uma entrevista?

Assistente - (Andando enquanto olha pra Leonora) Consegui falar com o assistente de um diretor ontem de noite. Ele confirmou uma entrevista para próxima sexta!

Leonora – (Andando enquanto olha pra frente) Espero que não mande o assistente cancelar que nem o último. Não há nada que eu odeie mais que falta de compromisso... só falta de profissionalismo!

A assistente, tensa, olha pra frente por alguns segundos.

Assistente – (Andando enquanto olha pra Leonora) Seu camarim está pronto! Já mandamos colocar...

Leonora – (Interrompendo) Espero que dessa vez não tenha nenhuma cesta com frutas tropicais. Colocaram uma semana passada e eu deixei claro que eu acho cafona.

A assistente passa por um funcionário e disfarçadamente sinaliza com as mãos para ele tirar a cesta da sala. Leonora entra em uma sala onde o diretor do seu programa e os membros da equipe estão sentados em uma mesa.

Leonora – (Se sentando na única cadeira vaga) Me desculpem o atraso! Já devem saber como o trânsito dessa cidade está insuportável.

Um membro da equipe que está sentado bem ao lado de Leonora fala com a apresentadora.

Membro da equipe – Já estamos próximos da temporada de premiações, por isso eu estava sugerindo chamarmos um colunista de televisão para ele explicar como funciona essa corrida e quem sabe dar os seus palpites. (Ele pega um jornal aberto e dá para Leonora).

Leonora começa a ler.

Membro da equipe – Aí tem uma matéria que ele fez ano passado em sua coluna sobre ''Espelho Mágico''. 

Leonora – Eu nem sabia que nós tínhamos crítica especializada em novelas.

Membro da equipe – Bom... Eu não diria bem especializada...

Leonora – Tenho certeza que os outros canais iriam adorar.

Diretor – É que nós estávamos pensando em trazer algo inédito. Afinal queremos que o programa continue sendo referência.

Leonora – E por que deixaria de ser?

Diretor – Err... Bem...

Leonora - Por que a TV Astro decidiu aproveitar um antigo deposito para criar um programa para um ex-correspondente de... Londres? Nova York?

Diretor – Paris!  

Leonora – Que seja! Qualquer pessoa em plena capacidade cognitiva que ler isso aqui vai concluir  que não é um conheço o colunista pedante e pretensioso que o programa precisa. Eu sempre tomei a dianteira e fui atrás dos meus convidados. Várias pessoas no meio me devem a carreira. Podem deixar que eu ainda não estou enferrujada. 

Corta para



Cena 3. Mansão de Stella. Interior. Manhã

Carlos anda até a sala, onde encontra Stella colocando gim em um copo de vidro.

Stella – Ora se não é o meu Jack Warner favorito! Quer uma bebida?

Carlos – Sem ironias, por favor!

Stella – Eu só o estou parabenizando! Pensei que tivesse mais orgulho de ajudar a tirar aquela emissora da lama.

Carlos – Vejo que a senhorita está bem! Não já está na hora se voltar para os estúdios? Faz ideia do prejuízo que tivemos interrompendo as gravações por causa desse seu suposto resfriado?

Stella – Quando é conveniente eu viro o Sol de vocês, e não uma mera coadjuvante.

Carlos – Ah, por favor! Isso é uma estratégia! Você sabe que se indicássemos as duas na mesma categoria os votos seriam divididos, que nem aconteceu no Oscar de 51 quando Anne Baxter deu um jeito de ser indicada à melhor atriz ao lado de Bette Davis. No final as duas perderam.

Stella – E quem Bette Davis fazia? A atriz em decadência e grande vítima da história! Como era minha personagem? Acho que não preciso responder, você certamente palpitou sobre o roteiro para sentir que teve uma participação maior do que teve.  

Carlos - (Irritado) Ah, francamente... Tenha mais compostura. Você assim era até engraçada no começo, mas agora só dá pena. 

Stella – Vocês sempre acharam ela melhor do que eu, isso não é nenhum mistério...  

Carlos – Quer saber mesmo? Ela sempre foi melhor... e você sabe disso!  

Stella – Mas quem é que vocês precisam recorrer para mostrar para o monstro que vocês criaram que ela acha que é a rainha do tabuleiro mas não tem o controle do jogo? Vou até fazer um martini para ver você se rastejando. 

Carlos – Rastejar não! Exigir que você cumpra com a sua responsabilidade contratual. Te dou uma semana! Acho que nem preciso falar muito sobre a cláusula de multa.

Corta para:

Cena 4. Rio de Janeiro/Paris. Mansão de Rita/Apartamento de Rebeca. Interior

Sonoplastia: Até o fim desta cena 


Takes do Rio Senna pela manhã, onde lê-se:

                   Paris

                   1978

Rebeca está em sua sala falando com Rita ao telefone.

Rebeca – Não incomoda nada! Eu estava me arrumando para almoçar em um restaurante que eu adoro em Champs Élysées.

Rita – O vestido acabou de chegar! Está bem guardado no meu closet longe de um cabide de metal! Tem certeza que é o momento apropriado para usá-lo

Rebeca – Você sabe as atrizes no tapete vermelho no Oscar ditam moda.

Rita – O que não é o caso em questão.

Rebeca – Mas nem por isso os holofotes estarão longe. Se não for muito abuso, você conseguiria para mim um autógrafo do Tarcísio Meira?

Rita – Você pode tentar pessoalmente, tenho certeza que a Glória não se importaria.

Rebeca – Você está querendo que eu saia daqui para enfrentar o calor tropical? (Risos)

Rita – Bom... Eu não estou com a mínima vontade de ir, então se eu não conseguir alguém para aparecer comigo é capaz de eu mais uma vez seguir os passos da Katharine Hepburn e deixar a premiação a ver navios.

Corta para Rebeca desligando o telefone, enquanto Roberto está em um canto da sala ampla colocando o seu blazer.

Roberto – Você já disse que uma escritora veio atrás de você querendo informações dela para um filme?

Rebeca – Ela já tem problemas demais...

Roberto – Ela vai acabar sabendo alguma hora. Mas você conhece a sua tia melhor do que eu, se acha que é melhor assim... (Faz uma pausa) Você já está pronta?

Rebeca – Claro! Nem me lembro a última vez em que eu não precisei chamar alguma amiga como companhia. Estou me corroendo de curiosidade para saber o que aconteceu.

Corta para

Cena 5. Mansão de Stella. Interior. Manhã

Fachada da Mansão de Stella. Virgínia está sentada no sofá. Stella leva uma copo com whisky e gelo até ela.

Stella – Eu tenho certeza que ela tem um espaço na estante para o prêmio.

Virgínia – Onde vai olhar e lembrar da derrota.  

Stella – Mas ela é praticamente a favorita. Pelo menos dos críticos.

Virgínia – Porque todos querem prever a vitória inesperada de uma atriz de série. Erga a cabeça e faça valer a sua história de superação.

Stella - Eu já perdi! Não só batalha como a guerra também. Sabe... há anos nós temos essa rivalidade discreta, e quando finalmente chega, eles preferem aquela cretina que não se colocava a disposição da mesma forma que eu. Quer dizer, ela vivia recusando papéis, selecionando os jornalistas com quem iria falar... Não dá para acreditar que todos se curvam para essa mulher que esnoba o nosso meio.

Virgínia - Eu também não gosto da forma como ela deve nos ver, mas garanto que ela não ficará por cima por muito tempo. A assistente de um diretor chamado Werner Adler me devia um favor e bem... Acho que consegui um roteiro pra você.

Stella - Então... vamos comemorar. Ainda bem que a Carmen deixou copos lavados...

Corta para

Cena 6. TV Astro. Interior. Manhã

Leila está sentado em uma mesa do restaurante do emissora onde dá para ver o vasto campo verde pelos painéis de vidro. Alberto passa pela mesa um roteiro segurando vários papéis.

Alberto – Leila?

Leila – Oi, Alberto! Sente-se, por favor!

Alberto se senta.

Alberto – (Mostrando os papéis) Sabe o que é isso? Acho que nem a Joan Crawford faria tantas sugestões.

Leila – Ao menos te colocaram pra supervisionar uma novela das 8.

Alberto – Você não faz ideia do que é trabalhar com ator que exige botas de camurça ou atriz que se recusa a entrar no set se tiver que contracenar com uma atriz iniciante com mais falas.

Leila – Você acha mesmo que uma ex-colunista que vivia dentro estúdios e se casou com um roteirista não conheceria as camadas mais profundas desse meio?

Alberto – Então você vai mesmo partir para a escrita?

Leila – Acho que no fundo eu sempre tive essa vontade. Acho que foi ver Rita e Stella embarcando em um projeto inusitado que me deu esse impulso (Risos). Quem sabe.

Alberto – Aí você veio trazer para o Menezes o roteiro.

Leila – E advinha a resposta. Não deve ser muito ortodoxo apostar em uma trama de uma autora iniciante que não é exatamente o que a emissora anda exibindo.

Alberto – Eu sei bem o que é isso...

Leila – Mas sabe, eu gostaria de saber a opinião de um profissional.

Alberto – Já encontrou um? (Risos)

Leila – Ah, para! (Risos) Por favor! (Mostra o roteiro para Alberto) Eu faço qualquer coisa.

Alberto – Ah... Bem... Eu já tenho que ir! (Se levanta da mesa e pega o roteiro) Mas posso levar o roteiro e depois contar o que achei.

Leila – Obrigada, mestre!

Corta para

Cena 7. Mansão de Rita. Interior. Manhã

Em uma sala, um homem toca um piano enquanto Rita fica ao lado do instrumento ouvindo a música.



Rita – (Cantando) The way you wear your hat / The way you sip your tea / The memory of all that / No, no, they can't take that away from me

Alberto aparece.

Alberto – Nem um show do Cole Porter poderia ser melhor.

Rita – Não só pode como realmente é! E você sabe. (Olhando para o pianista) Ele já viu o senhor Porter bem de perto em Nova York colocando os seus dedos mágicos no piano. Leila me disse.

Pianista – É mesmo?

Alberto – Mais ou menos, eu fui até o hotel onde o antigo presidente de um estúdio daqui estava hospedado e me encontrei com o senhor Porter no elevador.

Rita – Essa é a música da minha vida.

Pianista – Da minha vida

Rita – (Apontando pra si) Da minha vida! Eu posso te acusar de apropriação indébita.

Alberto – A última vez que eu ouvi

Rita – (Interessada) Qual é? Eu não posso morrer com essa curiosidade.

Alberto – “Love Is Here To Stay’’. Já ouviu o álbum da Ella Fitzgerald com músicas do irmãos Gershwin?

Pianista – Essa aqui? (Começa a tocar)



Rita – A primeira vez que eu ouvi essa foi em um Atlanta. Consigo até me sentir em uma casa de show.

Corta para:

Cena 8. Mansão de Rita. Interior. Manhã

Rita e Alberto vão para a sala de estar.

Rita – Aqui fica melhor. Por causa do vento aquele piano não precisa de ninguém sentado nele pra fazer barulho.

Alberto – Quem sabe ele não aprende a tocar Cole Porter.  

Rita – (Anda até uma estante) Eu falei com senhor Adler ontem em uma partida de golfe e ele me pareceu bem empolgado em trabalhar comigo nessa versão de “Crepúsculo dos Deuses”. (Pega o roteiro na estante) Até deixou o roteiro comigo.

Alberto – E você acha que pode dar certo?

Rita – Bom... Atualmente estão apostando em vilãs e megeras feitas por atrizes velhas depois do sucesso da nossa série. Quem nem aconteceu em Hollywood depois que “O Que Terá Acontecido À Baby Jane?” fez sucesso e do nada surgiram outros filmes de terror sobre velhas como “Com a Maldade Na Alma” e “A Mansão dos Desaparecidos’’.

Alberto – Mas “Crepúsculo dos Deuses’’ veio antes de febre.

Rita – Mas não deixa de ter os elementos. (Entrega o roteiro para Alberto) Aqui está! Dá uma olhada na cena em que a Norma mostra a mansão para o roteirista, o Joe.

Alberto – (Lendo o roteiro) Acho que eu vou ter um trabalhinho.

Rita – Não precisa ter pressa.

Alberto – Vou levar para casa e ainda hoje eu começo os ajustes.

Rita – Você tem algum compromisso hoje de noite?

Corta para:

Cena 9. Mansão de Rita. Interior. Manhã

Margo mostra para Alberto um quarto com uma escrivaninha. Alberto entra e observa várias fotos de Rita nas paredes.

Margo – É aqui! O quarto já está totalmente arrumado.

Alberto – Então vocês já sabiam que eu ficaria aqui?

Margo – A senhorita Spencer usa esse quarto para guardar quadros, pinturas e presentes que recebia dos fãs.

Alberto – Um amigo meu uma vez criou uma história sobre uma atriz que praticava rituais com os fãs em um altar secreto, praticamente uma seita secreta. Rita pelo visto tinha muitos apreciadores.

Margo – O senhor não faz ideia. Uma vez um príncipe árabe mandou um camelo de presente.

Alberto – O seu trabalho deve ser bem único e exótico.  

Margo – Certamente o senhor já ouviu falar sobre Mamacita, o braço direito de Joan Crawford. Há duas versões sobre os motivos que a levaram a voltar para a Alemanha. Um é que teria sido por crise familiar. Mas o favorito de todos é que ela estaria cansada da Joan descontar a raiva do seu fracasso atirando objetos nela em acessos de fúria. Eu sou muita grata à Rita por esse emprego, por causa dela eu consegui voltar a estudar! Mas eu não toleraria qualquer tratamento.  

Margo se afasta. Alberto observa os vários quadros com a imagem de Rita.

Corta para

Cena 10. Sala de Carlos. Interior. Manhã

Stella, com óculos escuros e papéis em mãos, anda pelos corredores da emissora. Carlos está sentado na mesa da sua sala em um telefone, até que é interrompido pela entrada da sua secretária.

Carlos – (Desligando o aparelho) Já até imagino... Quem é dessa vez?

Stella aparece na sala antes que a assistente pudesse se pronunciar.

Carlos – Vejo que está revigorada! Não pense que eu gosto de ser autoritário, mas um grande líder sabe que precisa de pulso firme para fazer a locomotiva andar.

Stella tira os seus óculos escuros e anda até a mesa.

Stella – (Andando) Certamente já estão colocando o seu nome ao lado do Churchill. Quantos líderes será que conseguiriam fazer neve com pedacinhos de papel picado?

Carlos – Eu não faço ideia do que você veio fazer aqui, mas agradeço ser for rápida! Eu tenho um almoço importante... (Olhando para o relógio no pulso) Daqui meia hora. Acha que é de bom tom eu levar algum presente para uma entrevistadora só para ser simpático?

Stella coloca na mesa o roteiro que estava segurando.

Stella – Leia! Tenho certeza que vai valer cada letra.

Corta para

Cena 11. Mansão de Rita. Interior. Manhã

Alberto lê o roteiro sentado em um sofá da sala, enquanto Rita está de pé.

Alberto – Me pergunto se isso não seria trabalho para um professor de caligrafia.

Rita – Quanto tempo você acha que vai levar?

Alberto – Mais do que eu levaria se o roteiro dele tivesse mais conteúdo. Vou ter que adicionar alguns diálogo.

Rita – Acho que a ideia do Werner era falar através da direção.

Alberto – E por isso tentar dar coerência para os devaneios dele vai ser como tentar parar uma correnteza.

Margo aparece segurando uma disco.

Margo – Encontrei!

Rita – Perfeito! O senhor Adler é um grande admirador do Bill Evans! Tenho certeza que irá adorar.

Margo – Eu tentei falar com o senhor Adler, mas só o assistente me atende.

Rita – Bem típico! Eu soube que a sua segunda esposa só conseguia se comunicar com ele mandando recado através do assistente. Mas ele não me deixará em segundo plano. Terei uma conversa com ele nem que seja em uma partida de golfe.

Corta para

Cena 12. Restaurante. Interior. Manhã

Alberto e Leila conversam em uma mesa.

Leila – Por onde é que você andava, Alberto? Eu ligava pra sua casa, mas ninguém atendia.

Alberto – Bem... Eu... Ando meio ocupado com negócios que eu poderia chamar de escusos (Risos).

Leila – Pode ficar tranquilo porque eu nem vou perguntar do que se trata (Risos).

Leila acena para um garçom, que vai até a mesa.

Leila – Uma taça... (Olhando para Alberto) Duas?

Alberto – Duas!

Leila – Duas taças de dry martini, por favor! Não precisa maneirar no vermute.

Pequeno corte.

Leila – Eu tenho uma notícia incrível! Querem o nosso roteiro!

Alberto – Que roteiro? Aquele seu?

Leila – Você me ajudou muito.

Alberto – Mas o roteiro ainda é seu! Se você conseguir algum prêmio, só precisa me dar uma caixa de chocolates (Risos).

Leila – Foi genial a sua ideia de explorar o lado neurótico da escritora enquanto ela demonstra uma certa repulsa pelo co-autor do seu filme.

Alberto – Você já escreveu?

Leila – Já! Já escrevi! Só que eu não trouxe. O que você acha de um jantar lá em casa? Assim você dá uma olhada no roteiro e quem sabe muda de ideia.

Alberto – Bom... Eu... Acho que seria ótimo!

Corta para

Cena 13. Mansão de Rita. Interior. Tarde

Rita está perto do piano. Alberto se aproxima.

Alberto – Me desculpe o atraso, Rita. É imperdoável, eu sei...

Rita – Olha, Alberto, ontem de noite eu passei mal e precisei de um calmante.

Alberto – Eu imagino! Está sendo um turbilhão pra todo mundo.

Rita – Eu não tenho ideia do que eu fiz com a minha vida nesses últimos anos e não sei se o que eu faço está funcionando. Parece uma escolha corajosa fazer esse filme, mas não sei se eu quero encarar o preço.  

Alberto – Como assim? Você estava tão empolgada com esse filme.

Rita – Eu andei pensando, refletindo, observando atrizes que souberam sair de cena. Talvez seja a hora de eu parar de me humilha e enfim me retirar com o que ainda me resta de dignidade.

Alberto – Você achava que a série poderia ser uma roubada, e no final todos viram o resultado. Um conselho: Não tome uma decisão tão drástica em um momento de fragilidade. Você vai dar o seu melhor como sempre fez e receber mais indicações.

Rita – E perder como deve acontecer esse ano.

Alberto – Confie em mim quando eu digo que você irá tirar de letra.

Rita – Acha que vai ser muita exposição eu interpretar uma atriz decadente nessa minha fase e deixar que façam um paralelo?

Alberto – Não deixa de ser um grande papel. Pensa que isso tudo pode te ajudar a entrar no personagem. Norma Desmond não aceita que o seu reinado como atriz no cinema mudo acabou e vive enclausurada em sua mansão rodeada pelo seu passado de sucesso. Acho que várias pessoas já se sentiram soterradas pelo que construíram ao longo da vida.

Rita – Tudo bem! Só me prometa que não me fará parecer ridícula.  

Vários flashes para mostrar uma passagem de tempo

Sonoplastia: Até o final da cena 14



Rita, em um sofá da sala, lê o roteiro com seus óculos e depois fala com Alberto, que está no outro sofá.

Rita – Essa parte está realmente pavorosa.

Alberto – Eu não entendi o que ele quis com esse monólogo.

Alberto escreve o roteiro na mesinha do quarto. 

Rita fica de pé vestindo um roupão preto e lê o roteiro enquanto Alberto assiste sentado no sofá.

Rita – “Eu continuo grande! As telas é que ficaram pequenas’’

Alberto joga em uma lata de lixo uma página do roteiro.

Alberto, de pé, termina de ler uma página do roteiro enquanto Rita assiste sentada tomando um copo com gelo e whisky.

Rita – Está bom! Mas... Acho que dá pra deixar o texto menos melancólico. Ela não percebe que o seu reinado acabou, então deveria falar do passado por vaidade, e não por querer voltar para essa época.

Rita, de pé, lê o roteiro para Alberto, que está sentando no sofá.

Rita – (Interpretando) ‘’Eu devo esse retorno aos meus fãs desde que abandonei as telas’’ (Faz uma pausa e em seguida sai do personagem) Por que você quer mesmo que eu leia interpretando?

Alberto – Só pra saber se o texto está natural.

Alberto escreve na mesinha do quarto, até que interrompe essa atividade para ler o roteiro de Leila.

Rita – Muito obrigada! Por tudo que você fez não só agora (Bebe do dry martini). Eu não sei onde eu estaria sem você.

Alberto – Nessa mansão incrível... Vendo todas essas conquistas.

Rita – E tem coisa mais deprimente?

Alberto – Que tal o meu estado quando você teve que pagar minhas mensalidades atrasadas no clube?

Rita – Sabe qual é um elemento comum nesses filmes terror sobre velhas aterrorizantes e desequilibradas? Uma vilã nesse tipo de filme costuma ter um fascínio pela sua versão jovem, basicamente um paralelo entre um passado de sucesso e um futuro decadente.

Alberto – Olha, Rita, você é uma atriz incrível! Podem não reconhecer que você continua em forma, mas nunca vão apagar o seu legado.

Rita – Eu sei! Por isso eu sempre digo que o auge da decadência é quando você permite que sua autoestima seja afetada. O problema é quando você está em uma posição de ter que obedecer quem tem o poder de ditar as regras. De qualquer forma, pense no que você mesmo disse quando achar que é o personagem do William Holden em “Crepúsculo dos Deuses”

Corta para

Cena 14. Clube. Interior. Manhã

Vista área do campo de golfe com alguns jogadores. Rita e o diretor Werner Adler andam pelo campo.

Werner – Rita, eu te devo desculpas por não ter ligado.

Rita – Me deve mesmo! Eu fiquei chateada.   

Werner - Mas se você assistir a novela, vai ter uma ideia do trabalho que eu estou tendo.

Rita – Eu imagino! Não deve ser fácil tirar leite de pedra daqueles atores. (Faz uma pausa) Você leu o roteiro que a gente mandou?

Werner – Li!

Rita – Então podia ter ligado você mesmo ao invés de mandar o seu assistente.

Werner – Ah, sim... O meu assistente! Ele precisa compensar o que recebe.

Rita – E então? Vamos fazer esse filme?

Werner – Oh... Sim... Claro!

Corta para

Cena 15. Escritório de Leila. Interior. Noite

Sonoplastia: Até o final desta cena


Alberto está sentado em uma mesa lendo um roteiro, enquanto Leila está de pé colocando whisky em um copo com gelo. 

Leila – Eu fiquei sabendo que a TV Astro ia gravar uma cena externa em um desses cenários improvisados naquele campo verde da emissora, só que desistiram por causa da chuva. Eles foram para o interior gravar em um aras, e advinha só o que aconteceu... Choveu por lá também.

Alberto – (Sem tirar os olhos do roteiro) Incrível!

Leila – Eu sei que é errado, mas eu também achei engraçado pela ironia (Risos).

Alberto – Eu estava falando do seu texto.  

Leila – Oh... Obrigada! Isso significa muito vindo de um especialista.

Leila observa um roteiro em uma mesa, pega e dá uma olha no título.

Leila – Então era essa a atividade misteriosa?

Alberto se levanta e pega um copo de whisky que está perto de Leila.

Alberto – Bem... Rita me pediu para cuidar do roteiro de uma adaptação de Crepúsculo dos Deuses que um diretor chamado Werner Adler quer produzir.

Leila – Humm... Já tenho em mente minha próxima história: Um homem passa a trabalhar para uma atriz que dedicou quase toda a sua a vida para o trabalho.

Alberto – Quando uma pessoa aproveita tudo que vê e ouve para criar ou auxiliar uma história, é porque já tem cabeça de escritor.

Corta para os dois na cozinha.

Alberto – Sabe... Eu não me lembro quando foi a última vez que eu passei a noite sozinho.

Leila – (Andando até a geladeira) Nem eu! É muito bom poder contar assim com alguém. (Abre a geladeira e olha em seu interior) Humm... Deixa eu ver... Tem um cheesecake que eu fiz ontem.

Leila leva para a bancada o recipiente onde está o cheesecake com calda de frutas vermelhas protegido por uma tampa de vidro.

Alberto – Parece perfeito.

Leila – Me desculpe se eu estiver sendo invasiva, mas eu andei pensando no que leva alguém como você estar só e cheguei até uma única conclusão.

Alberto – A óbvia! E até clichê... Eu viva trancado escrevendo por horas, vivendo em função de tentar decolar na minha carreira de roteirista.

Leila – Eu sempre acreditei que é melhor estar só se não encontrar alguém que te apoie nos momentos em que você precise.

Alberto – Eu sei o que você está passando. É claro que a separação é uma mudança abrupta, mas depois de um tempo nós voltamos a nos sentir normais.

Leila – Sabe que eu não acho que eu vou levar tanto tempo...      

Cena 16. Mansão de Stella/Mansão de Rita. Interior. Manhã

Fachada da mansão de Stella. Flashes de atriz escolhendo joias, sendo mostrado logo em seguida um cabelereiro aplicando laquê no cabelo da estrela, que está sentada em frente ao espelho. Corta para Stella sentada em uma cadeira do seu quarto, se deparando com a entrada de Steiner, o seu agente.

Stella – Como eu estou?

Sonoplastia: 



Steiner – Está linda! Como o Central Park durante o outono, com aquelas folhas vermelhas e amarelas caindo no chão.

Stella – Você sempre engraçado...Faria a gentileza de fechar o zíper do meu vestido?

Steiner – Com prazer.

Stella se vira de costas, enquanto Steiner fecha o zíper.

Stella – Eu andei pensando, a mulher que limpa os prêmios da Rita deve assistir as premiações sempre comemorando quando ela perde (Risos).

Steiner – Você foi uma das primeiras estrelas que eu agenciei, então eu te conheço o suficiente para dizer que eu sou seu amigo... E é nessa condição que eu vim te dar um conselho: Não faça isso!

Stella – O quê, exatamente?

Steiner – Rita já estava divulgando o filme com o Werner Adler. Todos vão saber que você tirou isso dela.

Stella se afasta e vai pegar o seu cantil.

Stella – Eu fiz um favor ao Werner. Se não fosse por mim, ele continuaria sendo enganado pela produtora onde ele trabalha quando ela dizia que um dia a sinopse da série dele iria ao ar.

Steiner – Você quer mesmo se queimar com essa história e ainda arriscar a sua carreira fazendo série ruim de terror?

Stella – (Indo até Steiner e exibindo uma tristeza sincera) Eu... Não tenho mais o que arriscar. Você já viu o personagens que me oferecem?

Corta para a mansão de Rita, onde a atriz está na sala acompanhada de Alberto e Leila, esta última ligando um rádio.

Leila – Meu amigo garantiu que a notícia sobre o Werner Adler sairia hoje.

Closes alternados entre Rita e Stella ouvindo o rádio.

Locutor – (Em off) Notícias no mundo do entretenimento: Stella Mancini revelou com exclusividade que já tem um novo trabalho. A atriz se prepara para dar vida à uma vilã pianista em uma série escrita e dirigida por Werner Adler, nova aquisição da TV Astro.

Rita fica em choque, colocando a mão na testa por alguns segundo. Stella fica feliz ouvindo tudo.

Locutor – (Em off) Ao que tudo indica, essa será umas das produções mais caras da história da emissora.

Stella – Vamos, Steiner! Antes que a minha carruagem vire abóbora.

Corta para Rita de pé bebendo dry martíni enquanto Alberto e Leila estão sentados em sofás.

Rita – Eu no lugar da Stella pediria um mandado de proteção contra mim. Eu seria capaz de jogar essa taça naquela cretina.

Rita anda até seu bar, onde pega uma garrafa de vermute.

Rita – Poderia ser o meu grande momento.

Leila – Ainda pode ser.

Rita – (Relativamente estressada) Como? Só iriam fazer esse filme por causa do Werner. Agora eu não tem mais papel, não tem mais série...

Sonaplastia:



Rita olha para os seus prêmios em uma estante.

Rita - Me desculpe... É que... Eu achei que finalmente eu estaria de volta.

Rita pega um de seus prêmios.

Corta para Stella segurando um prêmio com olhar melancólico.

Fim do oitavo episódio

 

 

 

FIM DO OITAVO EPISÓDIO.                                                               

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