Holofotes - Penúltimo Episódio

                                      


Série criada e escrita por:

Thiago Figueroa

 

Personagens deste episódio

 

RITA - ROSAMARIA MURTINHO

STELLA - ARACY BALABANIAN

ALBERTO - CÁSSIO GABUS MENDES


DIONÍSIO - LIMA DUARTE

MARGO -  BIA NUNNES

ANTÔNIA - VITÓRIA STRADA

VÂNIA - MARIANA XIMENES

CARLOS - ARY FONTOURA

LEILA - BIA SEIDL

REBECA - FRANÇOISE FORTON

ROBERTO - HERSON CAPRI

HEITOR - REGINALDO FARIA

 

participação especial

VIRGÍNIA – VIVIANNE PASMANTER

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Cena 1. Estúdio. Interior. Manhã

Stella, ao lado de um piano com um boneco de pano sentado nele, contracena com uma jovem atriz loira.

Stella/Nora – Está vendo aquela sofá? Foi um empresário libanês que me deu depois de ver o meu último show. Você sabia que o Líbano gosta tanto de jazz? As pessoas me adoraram por lá... Pena que o meu agente sumiu com tudo que eu consegui arrancar daquela plateia louca pelo repertório do Nat King Cole e sumiu em alguma ilha do Caribe. Mas um peixe no mar por mais que se sinta livre sempre corre o risco de ser pescado.

Stella atira a faca, que acerta o boneco de pano bem na testa.

Diretor – Corta!

Stella – Você não acha que eu exagerei demais não? Acho que dá para eu gravar de novo.

Diretor – Não, não! Ficou exatamente no tom ideal. (Gritando no megafone) Intervalo!

Stella anda pelos estúdios na mão, até que vê a figurinista da sua série conversando com um assistente e se esconde para ouvir tudo.

Assistente – Esse seu figurino ficou bem peculiar.

Figurinista – Me disseram que a personagem da Stella Mancini seria horripilante, então o figurino precisava estar de acordo.

Corta para:

Cena 2. Mansão de Stella. Interior. Manhã

Fachada da mansão branca. Virgínia, com uma garrafa em mãos, abre a porta, sendo recebida por Carmen, a assistente da atriz.

Carmen – Não demore muito! A senhorita Stella tem cena pra gravar!

Virgínia – (Entrando) Diz que eu trouxe gim que não parece ter sido cortesia de algum restaurante 3 estrelas!

Corta para Stella no seu quarto deitada em uma cadeira sendo massageada.

Stella – Acha que consegue dar um jeito?

Massagista – Você só precisa trabalhar na cãibra no pescoço. Ao menos a sua pele está ótima

Carmen bate na porta e entra.

Stella – O que aconteceu?

Carmen – Me desculpe, senhorita Stella!

Foco no reflexo de Stella no espelho.

Carmen – (Em off) Virgínia está lá na sala!

Stella revira os olhos.

Stella – Ah... Sim...

Corta para Stella descendo as escadas e se encontrando com Virgínia na sala.

Stella – Virgínia! Eu realmente não estou com tempo livre hoje. Passaram com um trator por cima do meu corpo e eu preciso tratar a minha pele antes de voltar ao set para tentar transformar carvão em diamante.

Virgínia – Não está se divertindo enquanto toca quase toda a discografia do Nat King Cole.

Stella - Por que você não experimenta trabalhar em algo que te lembre a época em que você levava o cachorro do editor chefe do seu jornal para passear?

Virgínia – Bom... eu não falo com você desde a premiação daquela revista pavorosa.

Stella – Carmen! Água com gás! (Faz uma pausa) Ainda bem que tem copos limpos. Carmen agora decidiu lavar só três vezes por semana (Faz uma pausa) Eu adorei aquela festa. Eu até prefiro essas premiações mais simples sem a prepotência da academia que ainda insistem em respeitar. 

FLASHBACK ON:

Bastidores da premiação, onde os atores, elegantemente trajados, estão reunidos bebendo martíni e pegando canapés servidos por garçons. Stella fala com Antônia, que está com um prêmio em mãos.

Stella – Meus parabéns! 29 anos e já tem mais um prêmio para colocar na estante.

Antônia – 22!

Stella – Só?

Antônia – Sempre dizem isso.

Stella – O topo já chegou, agora só resta o que vem depois.

Antônia – Eu não esperava que o meu primeiro trabalho teria essa recepção.

Stella – Quem esperaria não é? Fico feliz que pelo menos alguém está colhendo os frutos da nossa série. Agora você só precisa escolher com cuidado os seus próximos trabalhos para ter momentos melhores para se lembrar com melancolia quando acharem que você só tem idade para fazer velha amarga e louca. 

FLASHBACK OFF:

Virgínia - Você deixou a festa antes que eu conseguisse falar com você.

Stella – Eu tinha gravações no dia seguinte, nem estava bebendo. Obrigada por se preocupar comigo.

Virgínia – Eu fico feliz que fiz algumas amizades nesse meio. Eu ultimamente ando lembrando de como levar aquele pastor alemão pra passear me motivou a esfregar na cara do meu chefe que ele se arrempederia de achar que qualquer puxa saco era melhor que eu. 

Stella – E você conseguiu! E acabou ajudando muitas carreiras.

Virgínia – E destruindo outras, mas eu sei que faz parte do jogo.

Stella – Oh, sim! Uma jovem atriz que já teve que fazer de tudo para sobreviver em seu início de carreira pode te entender perfeitamente.

Virgínia – E todos podem saber o que ela fez se a sua filha decidir fazer um filme sobre a rivalidade entre duas atrizes, muito provavelmente inspirado em fatos reais. (Virgínia se senta em uma das cadeiras do quarto) A Loreta foi até mim, obviamente, achando que eu soltaria uma bomba.

Stella – Bom... Eu não tenho mais nada para esconder. O público já sabe tudo sobre mim.

Virgínia – Eu vim alertar porque eu sei pela minha experiência que nada impede uma fonte de ter o seu preço.

Stella – Muito obrigada, Virgínia, mas eu duvido que a Loreta consiga algo comprometedor sobre mim.

Virgínia – Enfim, se tiver algo escandaloso que você não consiga conter, você sabe que te darei espaço para você dar a sua versão e... pelo menos sair de cabeça elevada. 

Foco em Stella com sorriso falso.

Corta para:



Cena 3. Nova York. Casa nos Hamptons. Manhã

Sonoplastia: 


Fachada de uma casa perto da praia com os dizeres na tela:

                        East Hampton, NY

                                  1979

A câmera acompanha o trajeto de um carro até a porta da casa. O motorista se levante e abre a porta, revelando Rita, com óculos escuros e um chapéu, enquanto Rebeca sai logo atrás. A atriz anda até a porta e se encontra com Margo.

Rita – (Feliz) Margo! Você veio!

Margo – Achei que você só chegaria aqui no fim da tarde!

As duas vão entrando e andam pela casa.

Rita – A sua tia já está melhor?

Margo – Já! No final era só o que poderiam chamar de virose. Só ela para achar que poderia ser gripe espanhola.

Rita olha para vários ângulos da casa, até que para para olhar para um antigo quadro seu. Logo em seguida sobe as escadas. Corta para Heitor mostrando a planta de um projeto para Rita.

Heitor – Está vendo! Lá no Brasil diziam que eu era obcecado, parecendo um cachorro que não quer largar o osso.

Rita – Fascinante...

Rita – Você já está de saída?

Heitor – Eu tenho uma reportagem sobre o meu clube de jazz e bem... Alguém precisa garantir a presença dos executivos de Wall Street.

Rita – E das suas companheiras 20 anos mais novas.

Heitor – Você não quer vir mesmo comigo?

Rita – Depois dessa viagem!? Não se preocupe que sexta eu te encontrarei lá naquele restaurante do Central Park.

Heitor – (Colocando um chapéu) Você que sabe.

Corta para Rita e Heitor descendo as escadas com algumas malas. Rita vai até um pianista, que tem mais ou menos 40 anos.

Rita – Oi! Você deve ser o senhor Brecker! Eu estou ansiosa para as nossas aulas.

Senhor Brecker – É por isso que eu estou aqui!

Rita – O pianista que costuma me acompanhar ficou lá no Brasil. (Olhando para Margo) O Heitor está de saída. Pode ajudar com as malas, por favor?

Heitor – (Indo até a porta) Adeus!

Rita – (Acenando de leve com balançar de dedos) Tchauzinho!

A porta se fecha. Rebeca se aproxima.

Rebeca – Você não vai acreditar na notícia que eu tenho pra ter dar. O programa do Roberto vai começar ainda esse ano. Ele acabou de me ligar pra dizer que já está no Brasil.

Rita – Nossa... Que... Impressionante!

Rebeca – Pois é!

Rita - Imagino que você vá se mudar com ele.

Rebeca – Claro! Eu vou continuar a minha carreira de estilista por lá.

Rita – Você tem certeza disso.

Rebeca – Eu sou forte! Tenho certeza que vou conseguir.

Rita – Não, eu quero saber se é isso mesmo se você quer.

Rebeca para por alguns segundos.

Rebeca – Não é isso que você possa estar pensando. Eu aprendi com uma certa pessoa que você pode abrir sua vida com alguém sem precisar cedê-la.

Rita – De qualquer forma, eu vou adorar ter mais alguém para ouvir Nat King Cole.

Corta para:

Cena 4. Sala de Carlos. Interior. Manhã

Sonoplastia: 



Carlos está sentado em sua mesa, enquanto Dionísio está de pé mostrando um jornal.

Dionísio – Bom... Acho que eu não preciso nem pedir para você ver direito. Está bem nítido aqui: 5 prêmios em uma única noite.

Carlos – É bem... Inusitado. Quem diria que uma série conseguiria esse feito. O Alberto deve estar explodindo de felicidade.

Dionísio – Sabe quem também estaria comemorando? Todos nós! Se essa série fosse nossa... Como quase foi.

Carlos – Como eu ia saber, até outro dia aquela mulher era só uma colunista... Eu... Eu criei uma tendência! O que é bem melhor que... bem... seguir uma tendência. Você viu quantas emissoras começaram a explorar atrizes mais velhas em vilãs? Um tendência assim como as novelas capa e espada da Glória Magadan.

Dionísio – Ainda bem que eu sei como reverter o seu deslize.

Carlos – Como?

Dionísio – (Indo até a porta) Você vai saber.

Dionísio se retira.

Corta para:

Cena 5. Nova York. Casa nos Hamptons. Manhã

Rita, com uma taça de dry martini em mãos, vai até o pianista, que está sentado em um sofá da sala de estar, perto do sofá de das janelas com vista para areia e plantas.

Rita – Estão todos fora! O que acha de aproveitarmos esse tempo em que as paredes estarão surdas?

Senhor Brecker – Boa ideia, senhorita!

Os dois andam até o piano, onde o pianista se senta.

Rita – Eu queria começar com “Deed I Do”. Você conhece?

Senhor Brecker – Se eu conheço?

O pianista começa a tocar.



Senhor Brecker – Foi uma das primeiras músicas que eu aprendi a tocar.

Rita se senta no banquinho do instrumento bem ao lado do pianista.

Rita – Você está há muito tempo em Nova York?

Senhor Brecker – Desde os meus 21 anos. Eu sempre olhava que muitos dos discos de jazz que eu ouvia eram de Nova York e bem... Aqui estou!

Rita continua ouvindo a música por alguns segundos até que começa a cantar acompanhando o pianista.

Corta para

Cena 5. Nova York. Manhattan. Restaurante. Interior. Noite

A música embala uma vista aérea de Manhattan pela noite. Heitor está só em uma mesa de um restaurante chique, onde a música estava sendo tocada por um pianista. Um garçom entrega uma taça de dry martini em sua mesa.

Cena 6. Nova York. Casa nos Hamptons. Noite



Foco em um casal, cada um com uma taça de dry martini em mãos. A câmera segue para a direita e mostra os dois e Rebeca vendo Rita se apresentando ao lado do pianista, que também canta enquanto toca. Corta para Heitor andando até a porta enquanto ouve a cantoria. Rebeca e o casal se divertem. Rita para de cantar para dançar com Rebeca, enquanto o pianista continua tocando. Até que a porta se abre, revelando a entrada de Heitor. Rebeca e Rita ficam estáticas. O pianista continua tocando até terminar a música.

Rita – O que faz aqui? Ainda é quinta!

Heitor – Já é sábado!

Corta para Rita em frente ao espelho do seu quarto conversando com o reflexo de Heitor.

Heitor – Precisava mesmo dar uma festa?

Rita - Como disse a Bette Davis uma vez, uma atriz não é a mesma coisa sem o seu público. Então, eu achei que poderia comemorar mesmo que fosse só com um casal que morava na casa mais próxima.

Heitor – Eu sempre te apoiei na sua carreira. Tudo que eu queria agora é que você estivesse alí comigo para comemorar um projeto que é importante pra mim.

Rita – Apoiou? Mesmo? Tudo que eu me lembro é de ouvir que seria melhor eu enfim descansar, sair de cena... Para vir morar aqui nos Estados Unidos.

Heitor – Acho que foi um erro a gente tentar fazer isso funcionar. Eu vou procurar um apartamento em Manhattan.

Rita – Então quer mesmo acabar com tudo?

Heitor – Acho que é a melhor solução. Quem sabe nós não nos tornamos amigos depois.

Rita – Eu... Também acho.

Heitor – Não achei que tivesse essa reação.

Rita – O que você esperava? Que eu me rastejasse implorando para você ficar? Você não é o primeiro, é o quarto. Já leram várias vezes sobre a atriz que consegue emplacar qualquer papel, menos o de esposa. Continuarei de pé como sempre fiquei.

Corta para:

Cena 7. Campo de Golfe. Exterior. Manhã



Vista geral de um Campo de golfe. Alberto e Dionísio andam com tacos de golfe em mãos.

Dionísio – Praticamente todas as emissoras que eu conheço passaram o controle em diante. Algumas por uma linha sucessória e outras para alguém que estava em cargo de confiança porque a família é capaz de perder tudo em um cassino de Las Vegas.

Alberto – Você é o único, Dionísio. 

Dionísio – Eu ainda comando a TV Astro! O último pistoleiro do Oeste, praticamente o John Wesley Hardin das emissoras de televisão deste país. Só não sei por mais quanto tempo.

Alberto – Como assim?

Dionísio – Foi uma vida inteira de dedicação e não conseguir evitar a fase em que estamos. Outras emissoras disseram: Nós não estamos bem, mas pelo menos não somos a TV Astro.

Alberto – Não acredito que seja o fim, vocês tiveram novelas de sucesso esse ano.

Dionísio – No primeiro semestre! Depois de alguns anos fracos. Não estamos conseguindo acompanhar. Antes... Nós ditávamos tendência, hoje nós ficamos perdidos sem conseguir acompanhar as que os outros criam. A verdade é que esse roteiro está chegando até a conclusão. Mas talvez você consiga adiar os créditos finais.

Alberto – Bom... Eu tenho o que você precisa. Eu passei tempo mergulhado nessas obras do Tennessee Williams com embates psicológicos.

Dionísio – Fantástico! Pode conversar com o Menezes sobre o roteiro assim que puder, mas não se preocupe que a aprovação não ficará a cargo dele.

Corta para:

Cena 8. Restaurante. Interior. Manhã

Sonoplastia: Até o final da cena 10



Stella e Alberto conversam em uma mesa.

Alberto – Eu diria que a principal diferença entre esse roteiro e o outro, é que esse é mais psicológico. A Sílvia, ao contrário da Eveline, não é vítima.

Stella – Fale mais sobre a Sílvia.

Alberto – Ela é ressentida, manipuladora...

Stella – (Lendo o roteiro) Deixa eu adivinhar quem você idealizou para a Isabelle: Rita.

Alberto – De forma alguma. Convidamos a Glória Menezes e a Tereza Rachel.

Stella – Eu tenho certeza que ela me culpa por aquela versão de Crepúsculo dos Deuses ter afundado sem mesmo sair do papel.

Alberto – Vai por mim, Stella, Amargo Outono não foi uma viagem de barco em um mar turbulento só para vocês duas.

O garçom entrega uma taça de dry martini para Stella.

Stella – Ela esperava receber várias ofertas depois da nossa série. Pelo visto elas não acontecera. (Bebe um gole do dry martini) Será que ela seria o rosto que o público gostaria de ver fazendo Norma Desmond?

Alberto – Você vai aceitar? Acho que a nossa parceria foi bem produtiva?

Stella – Foi? Eu não tenho tanta certeza (Bebe mais um gole). Eu fui ofuscada, rebaixada à coadjuvante. Se eu tivesse feito a avó de alguma atriz de 30 anos que faz uma menina de 18 anos mandada para um convento, a minha derrota seria mais discreta. Eu já derrotei Eva Wilma em uma premiação e agora todos vão se lembrar de mim por ter sido a coadjuvante da Rita.

Alberto – Stella, nós precisamos de você nessa série. Só me diga o que você quer.  

Stella – Eu quero um adiantamento do meu adicional por estar em uma obra no ar, um motorista e a flexibilidade de poder declinar deste projeto de surgir um melhor.

Corta para:

Cena 9. Sala de Carlos. Interior. Manhã

Carlos está de pé, enquanto Alberto está sentado em uma poltrona.

Carlos – Como assim a Glória Menezes recusou? Ela vai fazer mais alguma novela com o Tarcísio? Será que Espelho Mágico já não foi suficiente?

Alberto – Ela quer descansar quando terminar Pai Herói. Tereza Rachel também não foi nenhuma surpresa, é praticamente um milagre quando ela aceita um papel em televisão.

Carlos – Só nos resta um opção, que deveria ter sido a primeira.

Alberto – Já até imagino.

Carlos – Tentaram replicar “Amargo Outono’’ em outras emissoras, mas só nós temos as atrizes originais. Ou tínhamos... Mas a outra volta, e recebendo menos, pode apostar.

Alberto – A combinação perfeita...

Carlos – Imagina só essas duas fazendo duas irmãs. Tenho certeza que será a irmã perfeita de “Amargo Outono’’

Alberto – Elas são antigas amigas.

Carlos – Amigas?

Alberto – Sim! Amigas.

Carlos – Eu não sei se eu já disse, mas esse é o seu problema: Você não tem visão.

Alberto – Sabia que você não é o único diretor de emissora que encostou nesse roteiro?

Carlos – Você não pensaria em fazer isso... Você tem um contrato com a gente.

Alberto – Eu só tinha um contrato com a emissora em que eu fiz o meu último trabalho.

Carlos – O que é isso? Você vai entregar o nosso roteiro para outra emissora.

Alberto – O roteiro é meu!

Carlos – Eu que criei essa tendência.

Alberto – Você sabe que não foi. Eu que escrevi “Amargo Outono”, tive que te convencer a aceitar, percebi o potencial daquelas duas... O que você fez? Me controlou, me subestimou. A condição desse roteiro ficar aqui é você não encostar em uma vírgula.

Carlos – Ok, ingrato! Quer que eu deixe por escrito que você venceu?

Alberto – Ingrato não, controlado! Mas não mais!

Alberto se levanta e anda até a porta dando as costas para Carlos.

Alberto – Tenha um bom dia.

Corta para:

Cena 10. Mansão de Rita. Interior. Manhã

Close em Alberto dentro do carro perto de um jardim da mansão de Rita. Corta para a atriz abrindo a porta da casa.

Alberto – Rita!

Corta para os dois sentados em sofás da sala de estar.

Alberto – Isabelle é o papel perfeito: Elegante, sofisticada... Que vê a sua redoma desmoronar em sua cabeça após ficar pobre.

Rita – (Lendo o roteiro com os seus óculos) Seria o papel perfeito, se você não fosse trabalhar novamente com a Stella.

Alberto – Ah, vamos, Rita! Você precisa admitir que não teria como ser outra.

Rita – Ela acabou com a nossa adaptação de Crepúsculo dos Deuses.

Alberto – Bem...

Rita – Ela deu um jeito de conseguir o roteiro daquele diretor traíra e fez o Menezes aceitar. Fez tudo isso e terminou em uma produção de terror horrorosa. Não sei como ainda não sente asco de trabalhar com ela.

Alberto – Pra mim também não é fácil. Se eu embarquei, é porque eu tenho confiança que dará certo. Você leu o roteiro, não foi.

Rita – (Com cigarro em mãos) Li... E está perfeito.

Alberto – Então aceite! É só listar as suas condições.

Foco em Rita pensativa.

Cena 11. TV Astro. Interior. Manhã

A câmera acompanha o trajeto de um carro até o estacionamento. Dele sai Stella, usando óculos escuros e um chapéu. A atriz anda pelos corredores e acaba se encontrando com Vânia.

Stella – Eu lembro de você... A antiga maquiadora que entregou para o elenco de “Amargo Outono”. Veio fazer teste para alguma promotora ou seja lá o que as atrizes da sua idade recebem?

Vânia – Não! Eu sou colaboradora da sua série.

Stella – Ah... Me desculpe! Eu não prestei atenção nessa parte do roteiro.

Vânia – Eu percebi que tinha interesse em virar roteirista. Aí o Alberto me deu várias oportunidades de ver de perto o trabalho de escrever uma produção.

Stella – Nunca é tarde demais, não é mesmo?

Corta para Stella entrando na sala de Carlos, que está sentado em sua mesa.

Stella – Menezes, eu andei pensando... Acho que eu deveria tirar umas férias. Vou me isolar em alguma cidade do interior da Itália.

Carlos – Fora de cogitação.

Stella – Eu acabei de fazer uma série.

Carlos – Ué? A Glória Menezes já chegou a fazer umas duas novelas por ano.

Stella – A Glória Menezes não tinha que lidar sabotagem de uma colega ressentida.

Carlos – O que?

Stella – A queridinha dos críticos resolveu se envolver na parte criativa, e o Alberto, é claro, está acatando todas as sugestões dela. Eu recebi o roteiro alterado. Ela cortou alguns monólogos e ainda sugeriu que as cenas iniciais deveriam ser dela.

Carlos – Vocês são as únicas disponíveis. Você deveria agradecer por nenhuma atriz tentar o seu osso.

Stella – Porque estão bem alimentadas. Só entrarei no estúdio quando me respeitarem.

Carlos – Eu até agora fui complacente com você, mas você lembra da cláusula do contrato que diz que você deve aceitar tudo que a emissora oferecer?  A outra opção é uma multa.

Stella - Pois bem... (Tira um cigarro da bolsa e acende) Eu não ando me sentindo bem. Irei ao médico para saber se é algum problema respiratório... Essa semana eu terei que ficar de repouso sem poder participar de leitura de texto.

Stella anda até a porta.

Carlos – (Jogando vários papéis no chão) Porcaria!

Corta para:

Cena 11. Mansão de Rita. Interior. Noite



Rita, Alberto e Rebeca estão sentados em sofás da sala.

Alberto – Segundo o médico, é problema respiratório.

Rita – Médico? Que médico? Justamente quando nós tiramos falas delas. Eu conheço esse truque, ela quer atrasar as gravações. Algumas atrizes de Hollywood faziam a mesma coisa. Mas ela não conseguirá manter.

Rita coloca os seus óculos e começa a ler um roteiro. Roberto aparece.

Rebeca – Onde você estava?

Roberto – Eu fui me encontrar com o Mauro Mendonça e a Rosamaria Murtinho para combinar uma entrevista e terminamos tudo em um jantar. Você conhece eles, não é, Rita?

Rita – (Sem tirar os olhos do roteiro) Desde os tempos no Brooklin! Não o de Nova York, claro! O de São Paulo. Esse ano eles fazem aniversário de 20 anos de casamento esse ano. Vou mandar algumas flores. (Para de ler) Alberto, esse é Roberto, o marido de Rebeca. Não sei se marido de sobrinha conta como genro.

Roberto – É um prazer!

Rita – Ele é de Curitiba, mas mora tantos anos em Paris que

Rebeca – (Olhando para Rita) Eu estava esperando o Roy chegar...

Roberto – (Interrompendo) Ainda com isso? Quantas vezes eu preciso dizer que eu não gosto desse apelido?

Rebeca – E quantas vezes eu terei que dizer que não é um apelido? É um nome para você usar fora do Brasil com mais impacto. Eu que não preciso, o Hitchcock fez o favor de tornar meu nome inesquecível.

Rita – Bem... Não é dessa forma que eu imaginava que seria a minha belle époque.

Rebeca – Enfim... Eu estava esperendo o Roberto chegar para fazermos uma pergunta: Você deixaria a gente fazer uma festa para o nosso aniversário de casamento aqui nessa sua casa?

Roberto – Desculpe se for muito abuso da nossa parte. Você sabe como a Rebeca é quando coloca alguma coisa na cabeça.

Rita – O primeiro casamente é sempre marcante... Eu me lembro quando eu pedi o consentimento do meu pai para me casar.

Rebeca – Como assim... Primeiro casamento?  

Rita – Só... Lembrança pessoal.

Corta para:

Cena 12. Mansão de Stella. Interior. Manhã

Stella está fazendo exercícios na sala da sua mansão, até que a campainha tocando a interrompe.

Stella – Já vai!

Stella vai até a porta até a porta fingindo fragilidade e a abre, revelando um entregador do outro lado, segurando um papel e um envelope.

Entregador – Obviamente eu sei que é a senhorita Stella Mancini.

Stella sorri.

Entregador – É da TV Astro. (Mostrando o papel para a atriz) Preciso que assine aqui.

Stella – E do que se trata?

Stella começa a assinar.

Entregador – Eu não sei! Isso é só para garantir que a senhorita recebeu.

Stella – Aproveita porque não é todo dia que se recebe um autógrafo com tanta facilidade.

Entregador – Tenha um bom dia!

O entregador se retira. Stella abre o envelope e começa a ler o documento contido nele.

Stella – (Lendo em pensamento enquanto passa os olhos pelo documento) Ausência no estúdio... Quebra de contrato... Multa...

Stella fica em pânico e coloca a mão na testa. 

Sonoplastia: Até o final da cena 14


Stella – (Gritando) Carmen! Coloca gelo em um copo.

Corta para:

Cena 13. Mansão de Rita. Interior. Manhã

Rita, Alberto e Leila fazem um brinde com taças de champagne ao som de um disco do Nat King Cole que a Rita colocou.

Corta para:

Cena 14. Mansão de Rita. Interior. Manhã

Rita está cuidando de alguns plantas em sua horta enquanto usa um chapéu de jardinagem. Dionísio aparece.

Rita – (Cuidando das plantas sem olhar para trás) Deve ser o meu novo agente. Chegou uma hora mais cedo. Eu agradeceria muito se pudesse me esperar lá na sala.

Dionísio – Bom... Acho que o seu agente deve ser um pouco mais novo.

Rita se vira.

Rita – O que faz aqui?

Rita se levanta.

Dionísio – Eu andei lendo um pouco sobre você e descobri que adora jazz. Aceita ir para um clube comigo hoje de noite.

Rita – Bom... Eu achava que nada seria mais inesperado que uma visita surpresa.

Corta para:

Cena 15. Clube de Jazz. Interior. Noite



Rita e Dionísio assistem em uma mesa a apresentação de um trio no palco.

Dionísio – Você morou mesmo em New Orleans?

Rita – Meu pai percebeu meu interesse em peças de teatro de navio e me mandou para os Estados Unidos achando que era só uma fase... Eu achei aquele lugar tão fascinante que voltei várias vezes. (Bebe um gole de dry martini) Sabe... Eu também já li sobre você em sua biografia.

Dionísio – Duvido... Eu devo ser pacato demais perto dos seus inúmeros roteiros.

Rita – Mas aí é que está: A realidade é combustível pra arte. Quer ver... Dionísio Mattos: Herdou o negócio de tabaco do pai e transformou em um império.

Dionísio – Impressionante...

Rita – Depois, mesmo com um patrimônio mais que sólido, decidiu se arriscar investindo na televisão. Praticamente o nosso Howard Hughes. Tanto sucesso deve ter exigido um sacrifício da sua vida pessoal... Isso deve explicar o seu recente divórcio... Desculpe... Acho que fui invasiva demais.

Dionísio – Você acertou em cheio. Eu chegava inclusive a dizer para a minha mulher que ela em durante alguns períodos seria praticamente solteira.

Rita – É complicado, tudo que você pede é apoio, compreensão... Você tenta conciliar mas só se preocupam em apontar que tem um coração de gelo e não liga para a sua família ou amigos.

Dionísio – É... Exatamente isso!

Corta para:

Cena 16. Takes do Rio de Janeiro

SONOPLASTIA: (Até o fim desta cena)



Takes alternados do Cristo Redentor, da praia de Copacabana e da Barra da Tijuca.

Corta para:

 

Cena 17. Mansão. Interior. Tarde



Dois carros pretos estacionam um de frente para o outro no jardim de uma mansão. Desses carros saem Rita e Stella, ambas trajando vestido preto. As duas atrizes andam lado a lado até a porta da mansão, onde Rita toca a campainha. Do lado de dentro está Virgínia, que recebe as atrizes.  

Virgínia – Meninas! Sejam bem-vindas. Vamos, entrem?

Virgínia anda com as duas pela mansão.

Stella – O outros convidados ainda não chegaram?

Virgínia – Seremos só nós três! Acho que eu disse que seria um jantar íntimo. Meu último evento grande foi uma festa que eu dei com o Tarcísio e a Glória.

 Virgínia as leva para uma sala de estar.

Virgínia – Podem se sentar.

As atrizes se sentam.

Virgínia – As senhoritas me acompanham em alguma bebida.  

Rita – Já passou das cinco, então... whisky.

Stella -  Vodka,

Virgínia se afasta.

Rita – Você acha que ela chama o Tarcísio para uma armadilha como essa?

Stella – O Tarcísio não precisa implorar por papel em série.

Corta para Virgínia e as atrizes sentadas à mesa.

Virgínia – (V.O) As experiências mudam a forma como vemos o mundo e nos acompanharão como fantasmas em nossas ações. De formas diferentes, transformações internas originam transformações externas. 

Corta para Vírginia escrevendo sozinha em uma mesinha do seu quarto.

Virgínia – (V.O) Rita e Stella são outras pessoas depois de contracenarem, então esse novo encontro não poderia ser igual ao anterior.

 

FIM DO PENÚLTIMO EPISÓDIO.                                                                  

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